26 de junho de 2013

Sparrow (Sparrow/2008)

sparrow

Na cena que abre Sparrow acompanhamos o grupo de batedores de carteira liderado pelo charmoso Kei. Toda a ação do bando é executada com uma sincronia perfeita e uma precisão absurdamente linda . Com uma cena tão simples, Johnnie To já dita o tom divertido do filme e estabelece aqueles personagens.

No seu tempo livre, Kei aproveita para curtir seu hobby de tirar fotos com uma antiga câmera. Porém uma misteriosa mulher cruza o seu caminho, chamando sua atenção. Mas não é somente ele quem ela enfeitiça com seu charme. Por um motivo inicialmente desconhecido, ela também aborda os outros membros do grupo com o mesmo modus operandi.

Apesar da trama ter vários furos, o filme não exige esforço para entender e acompanhar o enredo. Mesmo que a atitude de alguns personagens não faça muito sentido, o que o filme te exige é saber desfrutar uma narrativa divertida e inteligente. Temas caros ao diretor, como companheirismo e honra, são apresentados, porém não são discutidos.

Esta é a obra mais pessoal do diretor. As cenas foram sendo filmadas ao longo de três anos, quase que uma obra indie e com os atores filmando e refilmando cenas a medida que Johnnie To montava o filme entre um trabalho e outro.

Mesmo com uma forte influência do cinema europeu, Johnnie To mantém sua marca registrada. A trilha sonora, que mistura blues e jazz com um toque oriental, é uma das mais fantásticas e envolventes da filmografia de To. A cena final meticuloso, complexo, belo e caótico é uma homenagem ao musical francês Umbrellas of Cherbourg.

Ademais, as atuações são fantásticas, como sempre o uso de diálogos são mínimos. Rostos conhecidos como o de Simon Yam, Lam Suet, Gordon Lam, Lo-Hoi Pang oferecem atuações simplesmente deliciosas. Mas quem realmente se destaca e surpreende é Kelly Lin. A atriz taiwanesa consegue ser mais do que um colírio para os olhos, sua atuação é imprescindível para que o filme todo funcione.

O filme é uma verdadeira carta de amor de Johnnie To à Hong Kong. Cada quadro é filmado com uma beleza e esmero ímpar. A escolha de filmar em áreas onde ainda se mantém uma arquitetura tradicional dá uma atmosfera completamente diferente da metrópole frenética conhecida pelo mundo inteiro. Sparrow é um delicioso sorbet para qualquer fã do diretor saborear.

Hong Kong feelings: 4,5/5

Título Original: 文雀 (Mah Jeuk)

Diretor: Johnnie To Kei-Fung

Elenco: Simon Yam Tat-Wah, Kelly Lin, Gordon Lam Ka-Tung, Law Wing-Cheong, Kenneth Cheung, Lo Hoi-Pang, Lam Suet

25 de junho de 2013

Happy Together (Felizes Juntos/1997)

happy-together Ao som de tango, Yiu-Fai e Po-Wing bailam.

Com Happy Together, Wong Kar-Wai conseguiu o reconhecimento internacional ao concorrer a Palma de Ouro e ganhar o prêmio de melhor diretor no Festival de Cannes. O filme é uma mistura de todos os temas já discutidos pelo diretor em filmes anteriores como Chungking Express e Days of Being Wild, porém em um arranjo autêntico, além de ter sido bem controverso para a época.

Como em quase todos os seus filmes, não existe uma história que conduza o enredo. Novamente, Wong Kar-Wai nos oferece uma jornada extasiante  construída pelo acaso. Dessa vez acompanhamos um casal homossexual tentando reconstruir a relação em um outro lugar, longe de Hong Kong. A cidade escolhida foi Buenos Aires, alimentado pelo sonho de conhecer as Cataratas do Iguaçu.

O que observamos é o amor incompleto e destrutivo que Yiu-Fai (Tony Leung Chi-Wai) nutre por Po-Wing (Leslie Cheung). Yiu-Fai, uma pessoa de caráter controlador, se ressente de Po-Wing ser uma pessoa boêmia e egoísta. Apesar do relacionamento ser fadado ao fracasso, ambos acabam, de tempo em tempo, suprimindo a desconfiança em prol da realização do sonho.

Geralmente, Wong Kar-Wai concebe múltiplos personagens principais. Porém Happy Together é uma exceção, pois o enredo do filme é claramente centrado em Yiu-Fai. A atuação de Tony Leung é surpreendente pela naturalidade com que interpreta seu único personagem homossexual de sua carreira. De emprego em emprego, seu Yiu-Fai está sempre recomeçando. O que ele não consegue é recomeçar um relacionamento. Mas quem se destaca mesmo é Leslie Cheung. Se em Days  of Being Wild, ele havia arrebatado o coração de todas as damas com seu personagem incapaz de amar. Dessa vez, ele rouba a cena com seu personagem incapaz de amar somente a um homem.

A parceria entre Wong Kar-Wai e Christopher Doyle, seu fiel diretor de fotografia, atinge uma maturidade e elegância que só seria superada em In the Mood for Love. O jogo de cores, os enquadramentos, efeitos de câmera buscam amplificar os sentimentos dos personagens, suas angústias, paixões, tristezas, etc.  Além disso, as cenas onde a cidade de Buenos Aires serve de pano de fundo são belíssimas. Uma das cenas mais belas do filme é uma tomada aérea do Obelisco de Buenos Aires em stop motion.

A escolha de Buenos Aires é mais do que justificado e extremamente ressonante com a temática do filme. O tango é um estilo recorrente nas trilhas sonoras dos filmes do diretor, e filmar na Argentina certamente foi um sonho realizado. Outro fato é a cultura liberal de tolerância e respeito aos homossexuais do povo argentino, mesmo que o diretor não abra espaço para uma discussão desse tipo. O que Happy Together realmente é uma exilariante jornada sobre amor e recomeço.

Hong Kong feelings: 5/5

Título original:春光乍洩 (Chun gwong cha sit)

Diretor: Wong Kar-Wai

Elenco: Leslie Cheung Kwok-Wing, Tony Leung Chiu-Wai, Chang Chen

23 de junho de 2013

A Better Tomorrow 3: Love & Death in Saigon (Um Dia Melhor 3: Réquiem de Saigon/1989)

abt3 Amor e morte em Saigon.

Uma divergência criativa entre Tsui Hark e John Woo sobre o enredo de A Better Tomorrow 3 levou os dois cineastas a caminhos separados. John Woo ficou com o roteiro e foi filmar Bullet in the Head. Tsui Hark ficou com os direitos de A Better Tomorrow e foi filmar sua visão própria sobre a guerra do Vietnã. Se Bullet in the Head está para Apocalipse Now, A Better Tomorrow 3 está mais para Platoon.

A Better Tomorrow 3 é um prequela do primeiro filme que conta o passado de Mark. O pano de fundo é a guerra do Vietnã e ao longo da projeção acompanhamos as idas e vindas de Mark e suas complexas relações com seu melhor amigo Mun e com a female fatale Ying-Kit. Tsui Hark investe bastante no triângulo amoroso, sendo o elemento primordial que faz mover a história do filme. O contexto da Guerra do Vietnã é muito mal utilizado, mas faz sentido dentro da cronologia da série.

A atuação de Chow Yun-Fat não é tão poderosa quanto nos filmes anteriores, mas ainda sim seu Mark continua sendo um personagem absurdamente carismático. Ver Ying-Kit como uma espécie de tutora de Mark é um deleite para os olhos. Foi uma excelente sacada de Tsui Hark fazer a Chiu-Sing repetir as mesmas acrobacias de Mark. A dinâmica entre Ying-Kit e Mark é o ponto alto do filme. Completando o triângulo temos Tony Leung Ka-Fai interpretando Mun.

Em termos de narrativa e história, o terceiro filme é superior a A Better Tomorrow 2. A narrativa mais fluída nos permite observar com mais profundidade cada uma das faces do triângulo amoroso formado por Mark, Mun e Ying-Kit. Os sentimentos que cada um nutrem pelos outros é muito bem trabalhado pelo diretor e fica ainda mais complicado quando aparece um quarto indivíduo. Mas ao contrário de John Woo, Tsui Hark não transforma essas intricadas relações num turbilhão de emoções, preferindo disseca-las.

Porém, ao fim do primeiro ato, a sensação é de que o filme terminou ali. O segundo ato estranhamente parece mais um epílogo, com os personagens vagando sem um rumo definido. É necessário o terceiro ato para preparar o esperado derramamento de sangue. Porém, Tsui Hark não é John Woo, muito menos tentou imita-lo. O tiroteio final não tem a mesma epicidade e carga dramática, apesar do diretor investir forte no melodrama.

A mudança de direção teve pontos positivos e negativos. De negativo as cenas de tiro medianas. As atuações não são tão viscerais. Porém o filme não recicla o enredo do primeiro filme como foi o segundo, mesmo não aprofundando tanto  a temática da série que sempre buscou discutir qual a essência de um herói. Tsui Hark nos oferece um filme romântico onde exalta o companheirismo entre Mark e Mun. A Better Tomorrow 3 pode não ser um filme que muitos fãs da série esperavam, mas certamente é satisfatório.

Hong Kong feelings: 3/5

Título original:英雄本色III -夕陽之歌(Jing Hung Bun Sik Saam – Zik Joeng Zi Go)

Diretor: Tsui Hark

Elenco: Chow Yun-Fat, Anita Mui Yim-Fong,Tony Leung Ka-Fai, Shih Kien, Tokito Saburo, Maggie Cheung Ho-Yi, Nam Yin

22 de junho de 2013

Return to 36th Chamber (Retorno a 36ª Câmara do Templo Shaolin/1980)

return Chun Jen-Chieh se perfazendo de San Te.

Return to 36th Chamber é uma sequência do excelente The 36th Chamber of Shaolin. Neste filme somos apresentado a um novo personagem principal, porém com uma cara familiar. Chun Jen-Chieh é um artista de rua que tenta enganar os outros como forma de ganha pão. Quando os trabalhadores da tinturaria onde seu irmão trabalha começam a ser oprimidos pelos Machúrios, seus colegas o convencem a se perfazer como lendário monge shaolin San Te para intimidar os opressores.

Claro que tudo dá errado e Chun Jen-Chieh jura aprender kung fu shaolin com o verdadeiro San Te e livrar seus amigos da opressão. Gordon Liu volta a interpretar o papel principal. A princípio é meio confuso essa questão de Gordon Liu de ao mesmo tempo interpretar e não interpretar o seu personagem do filme anterior. Mas sua atuação neste filme mesmo com outro personagem continua igualmente prazeroso e divertido. O monge San Te continua fazendo parte do universo do filme porém interpretado por outro ator e com o status de um respeitado mestre de kung fu shaolin.

O filme tem um ritmo mais cadenciado e adiciona um humor que não havia no original, porém mantendo o elemento forte da série: o nosso herói deverá dominar os desafios da câmara do templo shaolin. No entanto, somente a 36ª Câmara comandada pelo Monge San Te é apresentada ao nosso herói Chu Jen-Chieh. Apesar do tempo de filme menor dedicado ao treinamento e do risco de cair na mesmice, Return to 36th Shaolin Chamber consegue entreter muito com os criativos treinos improvisado.

Return to 36th Chamber,ao invés de seguir a história do monge San Te, busca reaproveitar o mesmo enredo do seu antecessor mas com personagens principais novos. O grande barato do filme era ver justamente o personagem principal superando os desafios de cada câmara do templo shaolin. Dessa vez somos apresentados somente a 36º câmara criada por San Te no filme anterior, mas essa parte do treinamento continua sendo muito divertido. Além disso, o principal “defeito” do primeiro filme é corrigido para a alegria dos puristas que criticavam a falta do embate final entre o herói e o vilão. Vemos Chu Jen-Chieh usar todo o seu kung-fu shaolin improvisado para chutar a bunda do chefe manchúrio, sendo a luta ao mesmo tempo cômico e muito bem coreografado.

Hong Kong feelings: 4/5

Título original: 少林搭棚大師 (Siu Lam Ta Pung Tai Si)

Diretor: Lau-Kar-Leung

Elenco: Gordon Liu Chia-Hui, Johnny Wang Lung-Wei, Chen Szu-Chia, Kara Hui Ying-Hung, Hsiao Hou, Wong Gam-Fung, Cheng Wai-Ho, Wong Ching-Ho, Wa Lun, Lee King Chue, Yau Chiu-Ling, Cheng Miu, Kong Do

2 de junho de 2013

Jorney to the West–Conquering the Demons (Jornada ao Oeste-Expurgando os Demônios/2013)

journey to west História de pescador.

Jorney to the West é o primeiro filme de Stephen Chow em cinco anos. As expectativas sobre o filme não poderiam ser maiores. Apesar de Chow não estar no elenco, a sua presença na direção mais que garante o sucesso comercial. Com adiamentos da data de lançamento e um orçamento inflado, sendo o maior de todos os tempos para uma produção de Hong Kong, Journey to the West busca um lugar ao sol entre as inúmeras adaptações do livro homônimo.

Na cena de abertura somos apresentado a Xuanzhang (Wen Zhang), um caçador de demônios que segue os preceitos budistas. O nosso jovem herói tenta salvar o vilarejo do ataque. A cena é muito bem elaborada, porém peca em gastar tempo demais sem estabelecer a história do filme e os personagens principais, chegando a ser alienante. Se esperávamos uma história centrada no Macaco-Rei, o filme traz um frescor ao contar a origem do monge Tripitaka e como ele recruta seus discípulos para a jornada em busca dos sutras buditas. Porém este é somente um sub-enredo. A história central do filme foca no romance entre Xuanzhang e Miss Duan (Shu Qi), que remete a mesma temática explorada na adaptação dirigida por Jeff Lau com Stephen Chow como Joker/Macaco-Rei.

Por falar em A Chinese Odyssey, a sua trilha sonora é tão marcante que algumas composições de Jorney to the West são inspirados no filme de Jeff Lau. O momento mais inspirador certamente é da Shu Qi cantando a música Love of a Lifetime. Impossível não lembrar da cena final de A Chinese Odyssey Part II: Cinderella que encerra magistralmente a história de Joker e Zixia após uma longa jornada de amor dedicado e arrependimento irreconciliável. Ao mesmo tempo a cena é um ponto negativo para Journey to the West, apesar do casal Xuanzhang e Senhorita Duan seguirem os mesmos passos de Joker e Zixia não existe o mesmo peso emocional.

O elenco pouco estelar evidencia a crise que se passa no cinema de Hong Kong. O nome de maior apelo comercial acaba sendo o Shu Qi, uma atriz/modelo famosa mais por sua beleza do que por boas atuações. Sua atuação é totalmente inconsistente, incapaz de interpretar uma personagem durona de forte personalidade. O que é um grave problema, pois a Senhorita Duan forma o casal de personagens principais do filme. Todo o peso acaba caindo nas costas de Wen Zhang. Seu Xuanzhang funciona, no final, como um típico herói muito atrapalhado que descobre ser dono de um grande poder. Um papel que Stephen Chow teria interpretado a perfeição. Porém, o elenco não está a altura do talento de Chow. Inclusive o roteiro não colabora. Chen Bingqian e Shing Cheung-Lee interpretam respectivamente KL Hog e o demônio da água, mesmo na forma humana, o máximo que os atores tem que fazer é grunhir.

Por ser um filme de Stephen Chow é mais do que esperado cenas de comédia, porém além delas Journey to the West tem uma direção surpreendentemente sombria. Muitas mortes são chocantes criando um forte contraste com a sensação de um clima familiar na maior parte do filme. Temos uma mistura de gêneros, porém não funciona tão bem quanto em Shaolin Soccer ou King of Comedy.

O filme é uma fantasia com seres místicos e sobrenaturais, porém as escolhas de estética e figurino dos personagens são estranhas. Os demônios são retratados como seres bestiais numa modelagem mais realista, porém não ajudam a criar um ambiente fantástico. A falta de uma identidade visual própria é agravada pelo uso excessivo de computação gráfica para gerar paisagens simplesmente genéricas. Mesmo assim, tais cenas são as melhores que o cinema chinês já ofereceu, porém, anos-luz atrás de Hollywood.

Infelizmente, Jorney to the West é um dos filmes mais fracos de Stephen Chow. Há algumas cenas bem engraçadas, o que mostra que o rei da comédia não perdeu seu instinto cômico. Porém, Chow parece mostrar sinais de estar enferrujado depois de tanto tempo sem dirigir um filme. O filme tem um ritmo estranhamente cadenciado, como se não soubessem qual direção tomar. O drama e o romance não funcionam, no entanto parte da culpa reside na falta de química entre Wen Zhang e Shu Qi. As referências à Dragon Ball Z no final do filme, infelizmente, fazem um desserviço aos fãs. A imensa expectativa criada somente aumenta a decepção. É um filme que pode ser considerado bom para os padrões atuais de Hong Kong, porém mediano para os padrões do diretor.

Hong Kong feelings: 2,5/5

Título original:西遊.降魔篇 (Xi You Xiang Mo Pian)

Diretor: Stephen Chow Sing-Chi, Derek Kwok Chi-Kin

Elenco: Shu Qi, Wen Zhang, Huang Bo, Show Luo, Chrissie Chau Sau-Na, Lee Sheung-Ching, Chen Bing-Qiang, Xing Yu, Zhang Chao-Li, Cheng Sihan, Chiu Chi-Ling, Lu Zhengyu, Yang Di, Ge Xing-Yu, Fung Min-Hun, Xie Jingjing, He Wen-Hui, Tang Yi-Xin.